O Outro Eu

 

O outro eu é doido. Completamente insano. Faz coisas que nem ouso sonhar (e nem entendo).

O outro eu tem mais tattoos. E tem piercings e um cabelo legal.

O outro eu não está nem aí para o que os outros pensam. Xinga os atendentes de telemarketing no telefone. Grita. Esbraveja.

O outro eu surpreende até a mim.

O outro eu tem habilitação e dirige até caminhão. Anda de moto e não tem medo de avião.

O outro eu sabe nadar e não tem medo do mar. Nem de altura. Nem de não conseguir o que mais deseja.

O outro eu não chora assistindo filme de comédia romântica.

O outro eu é forte e não dá a mínima para a solidão. Consegue dormir tranquilo a qualquer hora do dia (e da noite).

O outro eu é louco e me dá medo. E não tem medo de nada. Consegue escrever uma crônica em 20 minutos. Sem necessitar de revisão.

O outro eu é interessante. Tem dezenas de amigos confiáveis. E todos gostam muito dele.

O outro eu bebe uma caixa de cerveja e nem fica tonto. Nem vai ao banheiro. E não tem medo de dizer não.

O outro eu escreve coisas absurdas em espanhol. Blasfema em francês. Canta em inglês e recita belíssimos poemas em italiano.

Ninguém se compara ao outro eu. Eu fico pasmo. Ele não ouve bobagens e deixa por isso mesmo. Nunca leva desaforo para casa.

O outro eu lê três livros por semana. E sempre os lê até o fim, mesmo se o livro for ruim.

O outro eu faz “mochilão” pelo mundo. Acampa. E não tem medo de viajar sozinho. E nem de se hospedar em hostels com desconhecidos.

O outro eu sempre tem histórias para contas. Pessoas para encantar.

O outro eu, às vezes, me olha de lado. Meio esquisito. Nem me reconhece.

O outro eu é diferente de mim. Ele é mais bonito. Todos gostam dele. Vive rodeado de amigos. E é inteligente.

O outro eu é sempre lembrado com carinho durante as conversas animadas.

Acho que o outro eu é um amigo imaginário. E, mesmo assim, ele consegue rir de mim.

Namorar ou não Namorar? Eis a complicação…

 

Ultimamente tenho conversado com as pessoas sobre relacionamentos e o conflito de interesses que ocorre neles.

Vou tentar explicar melhor:

Fulano, um cara legal, engraçado e que possui um blog criativo, conhece Beltrana. A princípio eles tornam-se amigos, sem se falar muito. Com o tempo, essa amizade vai crescendo, eles se falam mais e mais, até que Fulano vê em Beltrana aquilo que estava procurando há tempos: alguém que o faz sentir-se bem, que dá aquele friozinho na barriga quando a vê. Até ai, temos todos os ingredientes para mais um filme água com açúcar. O problema é que essa é a deixa para o vilão da história: o tal do conflito de interesses.
Junto com ele, entram em cena os coadjuvantes. Beltrana, que apesar de teoricamente ver algo em Fulano (eu disse teoricamente), gosta de Ciclano (ou Cicrano, como alguns preferem). Esse, por sua vez, não quer nada com Beltrana, uma vez que gosta da Seilaana (e não seria surpresa se ela se interessasse por um Qualquerano da vida). Pelo outro lado, Amigana, que (obviamente) é amiga de Beltrana, se interessava por nosso protagonista, o que acaba por dificultar qualquer possibilidade de entendimento entre Fulano e Beltrana. Voilá, em pouco tempo passamos de filme água com açúcar para uma novela mexicana.

Essa é uma história fictícia e qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência Mas acredito que entenderam o que eu quis expressar aqui, certo?

Agora a pergunta que não quer calar: Por que as pessoas simplesmente não gostam de quem gosta delas? Ao invés disso, preferem correr atrás, chorar, ficar mal, etc., por pessoas que também gostam de outras pessoas, que gostam de outras pessoas… Alguém parou pra pensar nisso em escala mundial (mundial é exagero, mas imaginem uma escala menor, no seu bairro, por exemplo)?

Por falar em filmes...
Juro que, às vezes, dá vontade de jogar tudo para o alto, queimar todo o meu dinheiro (que dinheiro?), meus documentos, adotar um nome qualquer e ir viver sozinho
na natureza selvagem do Alaska.

Incógnito

 

Desde criança eu quis ser mais notado, sempre estava inventando coisas para que meus pais pudessem fazer algum comentário (longo o suficiente para inflar o meu ego infanto-juvenil). E, realmente, fui notado no ensino fundamental, por duas vezes, que valeriam, ambas, pelo ano letivo inteiro.

A primeira vez foi na 5ª série, quando me convenceram participar dos Jogos Olímpicos Estudantis (ou algo assim) e me colocaram em três modalidades: salto em distância, 100 m rasos e 100 m com barreiras.

O mais incrível foi que não houve nenhum tipo de treinamento nem nada, apenas me deram um “bilhetinho” com a data, local e horário do evento (lê-se humilhação pública) para o meu “responsável” assinar – se fosse realmente responsável não deixaria que o filho participasse de um massacre dessa magnitude.

Fui razoavelmente mal no salto em distância, incrivelmente ruim nos 100 m rasos, mas a peripécia maior aconteceu nos 100 m com barreiras, onde, com uma habilidade descomunal, derrubei todas as barreiras que encontrei pelo caminho e não foi só isso, era um tombo cinematográfico em cada barreira que eu derrubava. Nunca, na história daqueles jogos, alguém tinha sido tão ruim.

A segunda vez foi na 7ª série quando eu tive a ideia idiota de participar de um capeonato de basquete da escola. E para piorar convidei (intimei) um amigo para ser o meu parceiro na modalidade “duplas” – e na modalidade “humilhação pública”. Fomos eliminados de forma absurdamente humilhante logo no primeiro jogo. Só me lembro que o placar foi um montão para eles e 2 pontos para a gente – consquistados com arremessos livres de faltas cometidas.

O tempo passou e eu decidi me dedicar mais aos estudos. Já que eu não levava jeito para os esportes, queria ser nerd, mas eu era mais rebelde que nerd, embora minha notas fossem dignas o suficiente para eu ganhar uma par de óculos quadrados, um protetor de bolso, algumas canetas, lapiseiras e uma calculadora científica.

(Tudo bem, eu confesso! Eu sou louco por canetas e tenho uma lapiseira Staedtler de estimação).

Eu tinha uma técnica infalível para tirar boas notas: eu só estudava um dia antes da prova e não mais que 1 hora. Aos invés de me acabar de estudar e deixar a diversão para depois eu me sentava na primeira fileira e prestava atenção a tudo o que os professores diziam, a todos os gestos e, até mesmo, no jeito de escrever e na letra de cada um deles. Mudei minha letra inúmeras vezes na época de colégio, sempre me espelhando no professor com a letra mais bonita – sou eternamente grato pela educação de qualidade que todos eles me proporcionaram.

Hoje eu tenho uma letra razoavelmente bonita e com estilo próprio.

E foi assim que me destaquei no colégio…

Mas minha vontade de ser notado se transformou no meu pesadelo pessoal quando dei início à minha epopéia, minha cruzada em busca do meu Santo Graal: o amor.

Hoje, após ter sentido todas as dores de um coração partido várias vezes e de diversas formas diferentes por conta de tentativas frustradas, acreditando, sempre, que um dia minha sorte mudaria e, finalmente, encontraria a mulher que abalaria minhas estruturas e se transformaria, naturalmente, no grande amor da minha vida… Enfim…

Aos trinta e poucos anos, nada mudou significativamente em minha vida e continuo, de certa forma, em busca de amor, mas, não quero mais ser notado… Só quero ser… Incógnito.

Encerro minha crônica com um trecho de Machbeth, de Shakespeare:

”A vida é um conto contado por um idiota, cheio de som e fúria, significando nada.”