Que Mente Insana Desistiria do Amor?

 

 

Todos sabem que muitas dores são recalcitrantes e detestáveis aliadas do amor. Mas quem nesse mundo desprezaria os sabores e os prazeres de um romance com receio de sentir suas angústias, suas possíveis decepções? Como renunciar as fragrâncias da paixão, com medo de um sofrimento que pode estar guardado no futuro, num pedaço do tempo que ainda não conhecemos?


Como dizer não aos prazeres da carne e da alma, quando nos aperta o peito o bater acelerado do nosso coração desatinado que fala mais alto dentro do nosso mundo conselheiro? Sendo a vida bela somente pelos encantos que ela oferece, quem ousaria não entrar nesse barco para iniciar uma talvez acidentada viagem sentimental pelo mundo dos sonhos que maravilham nossos dias?

Mesmo sabendo que o amor e o desafeto andam de mãos dadas, que importa o amanhã se hoje beberemos do suor dos amantes? Que venha o futuro com a inconsequência do seu desatar de nós, que foram atados pela sadia alucinação do amor. Quem desprezaria as juras de amor que julgamos eternas, sussurradas aos nossos ouvidos pelas bocas rubras que beijamos que nos entorpecem com seus aromas, que desenham estradas ardentes no solo fértil das nossas peles apaixonadas?

Sabemos que no amor o impossível quase sempre acontece, mas quem, na ânsia de ver seu reflexo no colorido de outros olhos, teria a imensa e insana coragem de se afastar da sua Bem-Amada (ou do seu Bem-Amado), temendo o que não podemos adivinhar?


Que venha o dia seguinte, que hoje estamos hipnotizados pela profusão da lua cheia, pelas estradas das estrelas, pelos ventos que invadem nossas janelas, desalinham nossos cabelos enluarados, descobrem todos os nossos lençóis, nossos segredos, nossa paixão.


Que partam para longe os nigromantes que inventaram o desafeto, se hoje a fantasia da vida pinta com as cores dos arco-íris as paredes dos nossos refúgios amantes. Que voem nos maus ventos esses mandingueiros que inventaram o sofrimento, pois temos ao amanhecer um jardineiro encantado plantando nas nossas janelas o colorido das orquídeas. Semeando nas nossas almas o nascer de uma floração que se extasia com cada traço de luz que nasce pelos olhos coloridos de uma nova alvorada.


Que carta ameaçadora pode nos mandar o futuro falando de um amor que findou, se hoje podemos espalhar pelo chão ardente de um amor que nos incendeia as entranhas, infindáveis páginas escritas pelas línguas ávidas de desejos, que recitam poesias em nossos corpos vibrantes, que escrevem versos nas nossas carnes trêmulas de desejos? Por que precisamos adivinhar o que vem sendo costurado pelo tempo, se hoje podemos costurar nossos próprios sonhos, escrever nossa história apaixonada nos travesseiros azuis, nas cobertas macias, com nossas mãos audaciosas e valentes plenas do mais puro amor do mundo?

Hoje, particularmente, não me preocupo com o declínio de um amor, com as ciladas que possam me surpreender, com o recuo de um afeto, se agora, são imensamente intensas e extensas as glórias do amor e da paixão. Que o futuro e os feiticeiros da dor ardam no fogo da inveja, porque só o hoje interessa ao meu coração.

 

 

 

 

S. Paulo, 14, manhã de uma terça-feira cinza de Dezembro de 2010.