Escrevendo Uma Crônica - Parte V (Final)



Domingo


Ressaca, dor de cabeça e uma sede sem fim que, provavelmente, dá nas pessoas que se perdem no deserto do Saara em pleno sol do meio-dia.
Eu olho para o meu barrigão e finjo que meus músculos abdominais cresceram numa proporção astronômica e me lembro da recomendação do instrutor da academia: "Em pleno domingo de sol, uma caminhada e uma salada de frutas lhe fariam muito bem."


Mas uma cerveja bem gelada e uma boa porção de torresmos bem sequinhos também.


Chego no santuário, digo, no boteco, que tem o melhor torresmo da região as 10 da manhã e o lugar já está cheio de fiéis, digo, botequeiros plantonistas.
Após algumas cervejas e uma generosa porção de torresmos olho no relógio e percebo que a tarde já está chegando e eu não terminei minha crônica ainda. Para ser honesto, nem comecei direito. Mas as cervejas, os torresmos e, principalmente, as conversas paralelas não me deixam ir para casa. Até ganhei uma porção extra de torresmos devido a quantidade de cervejas que bebi sozinho.


Decido ficar mais um pouco e logo vão chegando mais fiéis. É praticamente uma confraternização familiar.
E, de repente, fico muito puto da vida por ter esquecido o meu caderninho de anotações. E justo agora que o assunto principal é: "Mineiro, o dono do bar, casou-se com uma menininha de 22 anos."


Estou apaixonado - diz ele.


Eu o olhei (incrédulo), sorri e perguntei, sem delongas:


"Mas Mineiro, o senhor, nessa idade ainda não aprendeu a lidar com as armadilhas da vida? Esta menina vai ferrar a sua cabeça..."


E com uma gargalhada estrondosa, um dos senhores diz:

"Deixa ela ferrar! Quem não quer uma mulherzinha de 22 anos em casa? Queria eu!"



Depois de ouvir isso, pensei:

"Contra um argumento desses não dá para aconselhar absolutamente nada ao Mineiro. Se ele não aprendeu antes, não será agora, nesta idade, que ele aprenderá.



Todos em volta perguntam se ele ainda "dá no couro", ou seja, se ainda faz gol de placa ou se é apenas goleiro (que só usa as mãos).


"Dois golaços todos os dias. E sem o "azulzinho, hein!" Afirma, batendo no peito e consciente de que ninguém engoliu essa história.


Aí todos se viram para mim e perguntam se sou casado.
Sem pestanejar eu assumo que sou e ainda descrevo a felizarda:


"Ela é russa, muito gostosa, toda branquinha e com belos olhos verdes."


E peço para o Mineiro ir chamá-la, o que deixa o pessoal da roda embasbacados.
Alguns minutos se passam e o Mineiro volta com uma garrafa de vodka importada, um copo com gelo e duas fatias de limão.
Eu mal consigo me conter com tamanha falta de noção, mas alguém grita ao fundo:


"Deixa essa aí por minha conta!"


E assim eu economizo a grana da cerveja do dia seguinte.
São quase 17 horas e o sol também já está se preparando para ir beber uma gelada. Melhor voltar para casa. Tenho uma crônica para escrever. E, também, tem a gata que pode me ligar (ou não), que, com tanta confraternização familiar no santuário, digo, no bar, eu tinha até me esquecido do descaso dela.
Mas antes de ir para casa eu me lembro da recomendação do instrutor e peço uma saladinha de frutas:

"Mineiro, embrulha aí, para viagem, uma vodka com gelo e limão e uma dose caprichada de tequila com suco de laranja, pois a caminhada de volta ao lar é longa."
 

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